Hitler com música no coração
Pouca gente sabe isto, mas Adolf Hitler era um excelente dançarino, contava anedotas com mais piada que Wiston Churchill, era mais bonito que o Churchill, era um excelente pintor – pintava uma casa em apenas uma tarde e com duas camadas!!! É a face oculta de Hitler, o Hitler que tinha música no coração. Estas informações são reveladas em “O Falhado Amoroso”, o primeiro filme de Mel Brooks, realizado em 1968 e recordado hoje por “O Tronco da Teia”.
“O Falhado Amoroso”
(“The Producers” – pensamos que em Portugal também se chamava “Por Favor não Mexam nas Velhinhas”, mas não temos a certeza)
Ano: 1968
Realizador: Mel Brooks
Elenco: Zero Mostel (Max Bialystock), Gene Wilder (Leo Bloom), Kenneth Mars (Franz Liebkind), Estelle Winwood (Hold me, touch me), Christopher Hewett (Roger De Bris), Lee Meredith (Ulla), Andreas Voutsinas (Carmen Giya) e Dick Shaw (LSD)
Em Portugal existe uma edição relativamente recente em VHS, pensamos nós, da Costa do Castelo. O DVD, adivinharam, não existe por cá, nem com o sucesso da Broadway. Só de importação. O que vale é que tivemos a presença de espírito de gravar uma transmissão da RTP2, que continuamos a visionar periodicamente.
“The Producers” será, por estas alturas, a mais famosa obra de Mel Brooks, por “culpa” de uma adaptação musical de enorme sucesso aos palcos da Broadway, com Nathan Lane e Matthew Broderick nos papéis principais. Quem quiser assistir, basta ir a Nova Iorque e preparar-se para desembolsar várias centenas de dólares por um bilhete, que parece que é mais difícil de encontrar do que uma entrada para a final do Euro 2004. O sucesso de “The Producers”, o musical, possibilitou a recuperação de “The Producers”, o filme, mas na altura da sua estreia foi ignorado pelo público e maltratado pela crítica. Porquê? Porque foi considerado que era uma grande piada de mau gosto, por fazer comédia com assuntos demasiados sérios. N’ “O Tronco da Teia” discordamos desta opinião. Se há alguém que merece ser gozado e ridicularizado até à exaustão são os nazis e Adolf Hitler.
“O Falhado Amoroso” não fica nada a dever aos magníficos “O Grande Ditador”, de Chaplin, ou “Ser ou Não Ser”, de Lubitsch (de que Mel Brooks faria um “remake” em 1983), feitos ainda durante a II Guerra Mundial (sem o conhecimento do holocausto, mas já com referências à perseguição dos judeus), com um toque de cinema propaganda, mas com a arte dos grandes mestres. É claro que os nazis são o principal alvo, mas Brooks não poupa ninguém e atira-se aos produtores de teatro, aos actores, ao cinema musical clássico e até aos homossexuais, razão pela qual é, ainda hoje, bastante criticado.
A história é incrivelmente engenhosa - Brooks, para quem pensava que só sabia escrever cenas do calibre da sinfonia de flatulência de “Balbúrdia no Oeste”, ganhou um Óscar como argumentista por “The Producers”. Max Bialystock é um falido produtor teatral que usa cintos de cartão e seduz velhinhas para sobreviver que conhece um contabilista tímido Leo Bloom. Os dois combinam um esquema de produzir uma peça que seja um fracasso garantido para ficarem com o dinheiro dos patrocinadores (as velhinhas, claro, a quem Max, segundo as próprias palavras, proporciona uma última emoção antes de irem para o cemitério).
Para levarem a pior peça de sempre, começam por garantir o pior “script” de sempre, da autoria de Franz Liebkind, um antigo nazi exilado na América que escreveu “Primavera de Hitler” (que era o nome original do filme, mas Brooks, temendo o fracasso, decidiu não o utilizar), uma peça que revela a intimidade do Fuhrer e de Eva Braun – aqui ficamos a saber que Hitler era um excelente dançarino, pintava muito bem e era mais bonito que o Churchill. Depois, segue-se angariar o dinheiro dos patrocinadores, contratar o pior encenador e os piores actores. Enfim, tudo o que é preciso para garantir um fracasso, e não contamos mais.
São muitos os momentos a ter em atenção, mas não resistimos a deixar alguns:
- a cena inicial de Max envolvido num intenso “roleplay” erótico com um velhinha, em que desempenham vários papéis (a inocente rapariguinha do leite e o atrevido rapaz dos estábulos, ou o escaldante a condessa e o motorista).
- a visita ao encenador Roger De Bris (“Bialystock and Bloom, I presume? Forgive the pun”)
- E claro, todas as cenas de “Springtime for Hitler” (“Don’t be stupid, be a smarty, come and join the nazi party”, para além de ver Hitler como um hippie que planeia as suas campanhas ao piano e diz baby)
Uma das melhores comédias de sempre? Vejam e formem a vossa opinião.
Por Eduardo D. Madeira Jr.